terça-feira, 23 de novembro de 2010

Pedras

A mim as pedras gritam.
São elas que estão lá, aqui
E em todo o lugar
Que me gritam, sobre eras passadas

Não gritam através de palavras
Muito menos imagens
Mas através da sua existência
Gritam histórias que nunca cogitei sondar

Gritam sobre o tempo
Tempos que passaram e passarão
Como mil e um demônios desejosos

Gritam de como são pequenas
Mas que quando juntas construíram e destruíram fortalezas
Gritam de como são transitórias
Pois mal do ventre da terra saem, à terra retornam como areia.

Gritam sobre monstros
Sobre lendas e orgias
Sobre impérios e filosofias
Sobre demônios e deuses imortais esquecidos

Gritando estão elas
O livro das eras
A história das histórias
A catastrófica e magnífica odisséia da terra

“Logo estareis entre nós
Logo teus nomes em epitáfio aqui estarão escritos
Mas nosso pai, criador e assassino
Encarregar-se-á de apagá-los
Para que conosco mais de seus filhos possam construir suas casas”
Gritam me elas.

Minha futura lápide
Futura pilastra base de teu lar
Rezo que de minha morte
Algo bom surja

Que os vermes
Devorem minha carne e meu cérebro
E que estes pequenos sejam ceia de outros maiores
E assim o ciclo gire

Rezo para que esta caótica e harmoniosa
Orquestra continue tocando
A Ilíada das eras
A jornada dos tempos.

Rezo junta a vós, pedras amigas
Para que o tempo perpetue-se
Até onde ninguém mais
Medi-lo possa.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Do início ao fim

Do pó ao pó
Da terra a terra
Da poesia a poesia

Vem a mim e me possui, faz de mim teu receptáculo
Mata-me, destrói-me, lacera-me
Dá-me a vida, dá-me a morte
Da deusa apaixonada,
Dá-me o carinho!
Grito tomado por soberbo frenesi

Minha caneta grita minha loucura
Assim como rugem os machados
Dos Peles de Urso*

Minha mão tremula
Minha nuca arrepia
Escrevo como o enfermo desesperado
Escreve seu testamento
Sinto o poder de cada onda e o peso de cada pedra
Sinto poder desafiar os panteões

Um com cada virtude
Um com cada pecado
Alfa e Omega em um

Transbordando do meu espírito e da natureza
Pela minha caneta
Traços e gotas de tinta
Que são na verdade poesia
Que aos pouco se corrompe
Tornando-se poema

Aos mal ditos olhos
Às bem ditas bocas
Aos, tanto, mal ditos e bem ditos ouvidos

Quais olhos lerão deste poema?
Quais olhos transformá-lo-ão
Em poesia?
Como poema ecoará no tempo e espaço
Mas sua essência emergirá do mausoléu onde se encontra
Em poesia, na hora certa e ao deus certo.

Do pó ao pó
Da terra a terra
Da poesia a poesia.

Tristeza

Chora, grita,esbraveja jovem menina
Sabe que ninguém lhe escuta
Pequena jovem rouca chorosa
Amargurada, presa frustrada

Chora desconsolada
Chora, não sabe que é observada
Chora, pois sabe que
Seu carcereiro é seu genitor

Menina que não se cansa de uivar
Pare menina! Pois chove lá fora
E seus brados serão abafados

Menina que não sabe que seu observador é seu genitor
Menina cala-te, pois sei teu nome!
Tristeza, por favor, cala-te!